Now playing: do Switch ao Classic e ao Game Pass no PC

Assim que as conferências da E3 acabaram e o trabalho permitiu, mergulhei em um punhado de jogos como se não houvesse amanhã. De indies no Nintendo Switch a clássicos do primeiro PlayStation e por fim tirando proveito do novo serviço Game Pass no PC, acabei não terminando nada além de um jogo, mas não pretendo parar nos outros tão cedo. Quero terminar pelo menos alguns antes de mergulhar em outras coisas pós-E3, como o novo DLC de Borderlands 2 de “ponte” para o terceiro jogo… Embora isso possa esperar até chegarmos mais perto do lançamento. Sem mais delongas, vamos ao que ando jogando:

Devolver e Switch, uma combinação irresistível

Os jogos da Devolver às vezes podem ser meio sanguinolentos demais para a imagem “família” da Nintendo, mas indies caem bem demais no Switch e a melhor garantia de qualidade para jogos indies é conseguir ser publicado pela Devolver, então… O círculo de must buy assim se fecha. Entre eles, terminei Gato Roboto, o “Miautroid” já elogiado aqui, e deu vontade imediata de começá-lo de novo naquele mesmo momento. Demorei cerca de 5 horas para conseguir 81% de conclusão, enquanto alguns juram que dá para fazer 100% em menos de 4 horas, o que quer dizer que… Ou a idade chegou forte aqui, ou o pessoal corre demais, ou as duas coisas (minha aposta, sendo honesto).

Vale acrescentar aqui algumas coisas ao artigo anterior. Primeiro, por mais que pareça curto, é por isso que o custo do jogo é mais baixo que o normal dos indies atuais, e vale cada centavo. Segundo, embora seja um Metroid, Gato Roboto tem menos backtracking (voltar a áreas anteriores) do que se esperaria: você pode muito bem só seguir em frente, de forma quase linear, voltando apenas ao hub principal para resolver cada nova área, mas vai passar ainda mais longe dos 100% do que eu (achei 11 dos 14 cartuchos, por exemplo). Terceiro, o jogo em si é relativamente tranquilo, quase beirando o fácil demais para quem está acostumado com Metroids… Exceto em uma coisa: os chefes (os roedores em especial). Esses podem fazer você ranger os dentes nas primeiras duas ou três vezes, mas com um pouco de prática você chega lá; eles estão naquele ponto perfeito de “pô, tá osso, só mais uma tentativa, ops, consegui!” que nem todo jogo 2D consegue alcançar.

Só não voltei a ele porque achei que era hora de pular para outro indie de 2019 que estava enrolando para iniciar desde o lançamento, Katana Zero. A princípio, ele parecia “apenas” uma reinterpretação 2D lateral de Hotline Miami com cenário e protagonistas diferentes: um assassino samurai em um ambiente cyberpunk meio nebuloso. Você navega por edifícios e telhados tentando matar todo mundo na fase sem sofrer um único golpe ou tiro que seja, voltando de imediato ao início se isso acontecer. Junte uma estética sangrenta, meio anos 80 reimaginados, a uma trilha sonora tecno-retrô e até transições de fase imitando menus e rebobinação de videocassete… e a influência de Hotline Miami fica clara. Só que o jogo se esforça para ir além e surpreender em outras áreas.

Para começar, a história aqui não é tão vaga e nebulosa e é tratada de maneira mais “tradicional”, até certo ponto. Há diálogos com escolhas (inclusive com barra de tempo, linha jogo da Telltale), uma sequência de eventos mais compreensível e linear (embora não totalmente), e a sensação de que a cada fase ou duas você vai descobrindo sim mais coisas sobre o que está acontecendo, em vez de apenas viver um sonho febril. O cenário cyberpunk não é à toa, já que a história envolve drogas, tecnologia avançada, poderes psíquicos e consequências sociais de uma guerra violenta. E há uma expectativa até o final, já que entre cada fase vemos uma auspiciosa tela “X dias restantes”… Estou chegando lá e já faço uma ideia do que a essa tela se refere, mas vamos ver o que a conclusão da história nos reserva.


Além de tudo isso, as habilidades do samurai, que incluem uma rolagem de esquiva, desacelerar o tempo e defletir balas com a espada, dão outro gosto para o combate e complementam a história. Até a tal rebobinação de videocassete tem uma explicação no cenário, atrelada ao fato de voltar ao início quando você falha – na verdade, seu samurai está “prevendo” o que vai dar certo ou não. Após cada área bem-sucedida, você ganha um replay do resultado final sem as manipulações temporais, de forma bem semelhante a Superhot. E é aí que eu percebo… Jogo com inspirações de Hotline Miami e Superhot + narrativa elaborada e mecânicas e cara próprias? Isso foi feito sob medida pra mim, foi? Quando a gente começa a votar nos Melhores de 2019 mesmo?

“Classicando” nos RPGs com o botão direcional

Se você é daqueles que acreditou que a animação com o PlayStation Classic ia passar rápido, sinto informar que não vai acontecer tão cedo. Mesmo com todas as novidades, ele ainda está ligado aqui, e não devo largar dois jogos dele até terminá-los. O primeiro, claro, é Revelations: Persona. Vocês sabem que eu sou fã da série e ainda não concluí nenhum dos jogos pré-Persona 3, então resolvi começar do início, apesar de alguns pesares aqui e ali. Por exemplo, a movimentação é meio esquisita com o d-pad – não que seria melhor com uma alavanca moderna, e sim porque a visão do jogo é isométrica, com o chão dividido em quadradinhos diagonais, mas ainda usando as quatro direções tradicionais. Ou seja, para mover para a diagonal baixo-direita, você aperta o d-pad para baixo, e assim por diante. Com o tempo você se acostuma, mas é uma boa demonstração de como desenvolvedoras ainda estavam tentando se achar nas novas possibilidades do PS1 original.

Outra coisa engraçada no início mas que dói um pouco com o tempo é a tradução para o inglês. Não desce tanto a um nível “all your base are belong to us”, mas sobram erros de ortografia, e aí é difícil não se perguntar se alguma coisa foi mutilada do original. Ainda assim, a história é bem envolvente e surpreendentemente complexa para os padrões da época: uma corporação criou uma máquina capaz de abrir portais entre dimensões paralelas e, como se trata de um Persona, isso fez demônios de todo tipo invadirem uma cidadezinha, em especial uma escola. Alunos dela passam a invocar aspectos de suas personalidades como entidades capazes de enfrentar os demônios, e uma série de reviravoltas vão desvendando a natureza das realidades paralelas e o comportamento estranho de várias pessoas após a ruptura.

Quanto ao combate, ele é mais parecido com o dos primeiros Shin Megami Tensei do que o dos Persona posteriores, incluindo até a negociação com os demônios em combate para obtê-los – algo que nos Persona modernos só voltaria no quinto jogo. Aqui você não ganha o demônio em si para já colocar na party, e sim uma carta de tarô para usar em fusão de personas depois. Ah, e outra surpresa: todos os membros da party podem trocar de personas, ao contrário de Persona 3 em diante, quando só o protagonista é “especial” o bastante para fazer isso. De resto, os elementos gerais são bem conhecidos para quem jogou Persona 5: escolhas de menu entre ataques com armas brancas, de fogo ou as “magias” de seus personas, todas atreladas a elementos contra os quais alvos podem ser fracos, fortes, imunes etc. E a bizarrice no design dos inimigos já estava lá, como a foto acima demonstra: três privadas com meninos dentro e duas bolas de basquete comandadas por atletas invisíveis…

Mudando de jogo, a excelente apresentação do Remake de Final Fantasy VII na E3 me deixou coçando e não consegui resistir, iniciando o jogo original antes de terminar Revelations: Persona como pretendia. Não há muito o que dizer sobre ele – todos vocês já o conhecem bem até demais, né – mas vale avisar que eu sempre tive uma bronca com certos aspectos da trama desse Final Fantasy desde que tentei jogá-lo pela primeira vez, em especial toda a baboseira ecoterrorista, típica dos anos 90. Tentando de novo agora com ciência total desse lado ultraclichê, noto que o jogo se concentra muito mais nos personagens e no mistério do que é a energia mako no planeta, o que deixa a narrativa bem mais agradável. Ainda acho a representação da Shinra como corporação “superdumal” bem binária, mas o tratamento dos outros personagens é bem mais elaborado do que se imaginaria possível com tão pouco espaço para texto na tela. Ah, e a direção de câmera é sensacional até para os padrões de hoje, incluindo transições incríveis in-engine entre flashbacks e tempo presente que não se vê nem em jogos modernos.

Usando o Netflix da Microsoft no PC para descobrir uma pérola

Como avisei aqui no artigo sobre a conferência da Microsoft na E3, eu assinei o Game Pass versão PC quase na mesma hora. Já aproveitei promoções linha “um mês por R$ 1” umas duas vezes no Xbox One, mas na prática sempre acabava baixando um jogo ou outro e esquecendo deles até a assinatura expirar, já que quase não ligo o console mais. No PC a história é diferente, e como ainda não tenho diversos jogos da biblioteca do Game Pass que me interessam, por R$ 14 ao mês, parece um ótimo negócio. E tirando as chateações com a Windows Store/o novo Xbox app/o Windows em si, é isso mesmo.

Junto com o serviço, a Microsoft lançou um novo aplicativo dedicado para o Game Pass, chamado apenas de “Xbox (Beta)” (não confundir com o Xbox Console Companion que já existia), para gerenciar seus jogos instalados, sejam eles disponíveis pelo serviço ou adquiridos diretamente na Windows Store. O aplicativo funciona bem melhor do que a Store como um organizador e ponto de partida para iniciar os jogos, mas não esperem recursos semelhantes aos do Steam direto nele; na prática, coisas como bate-papo, captura de telas/vídeos e afins são gerenciadas pela Barra de Jogos do Windows, que também foi atualizada e expandida. Ah, e espero que sua instalação do Windows 10 esteja tinindo, porque aqui bastou algum erro geral de permissões para que alguns jogos não fossem instalados nem por decreto, e só consegui resolver de vez restaurando o sistema operacional todo.

Problemas do Windows superados, reinstalei imediatamente a edição completa de Forza Horizon 4 para conferir a expansão Lego Speed Champions, e o resultado vocês já puderam conferir no artigo anterior. Depois chegou a hora de conferir os tais jogos do Game Pass que me deixaram curioso, e de cara instalei Into the BreachVampyrVoid BastardsMutant Year Zero: Road to Eden, um dos que tinha baixado no Xbox One mas nunca chegado a abrir, e acabou sendo o primeiro que conferi aqui. Comecei a jogar no sábado passado e fiquei o resto do fim de semana nele, sem abrir qualquer outro jogo.

O conceito dele era intrigante, mas tinha minhas dúvidas se podia dar certo: um jogo de aventura/RPG leve que usa combate tático a la XCOM moderno (a partir de Enemy Unknown) como base. Se você me forçar a escolher meu jogo de estratégia preferido da atualidade, com certeza será esses XCOMs, então a coisa toda já era promissora… Mas ainda estava desconfiado do quanto o lado “aventura” realmente iria contribuir. E, olha, é bastante, até porque não é só aventura. O lance é o seguinte. O jogo se passa em um futuro pós-apocalíptico nas florestas do norte europeu em que, por algum motivo que ainda não descobri, alguns animais e humanos se tornaram mutantes e se juntaram em uma Arca, enquanto o resto morreu ou virou semizumbi (humanos ainda sencientes, apenas deformados e meio burros). Os habitantes da Arca saem em expedições por recursos e evitam ou enfrentam os semizumbis, que por sua vez volta e meia tentam invadir a Arca.

Essa premissa não é ultrainovadora mas pelo menos difere um pouquinho do usual de um Fallout da vida, e além de replicar bem o humor fino dos primeiros jogos da série, ainda serve como bom propulsor para as mecânicas próprias do jogo. Você parte para áreas isoladas com visão isométrica usando mutantes – entre eles, o pato e o porco antropomorfizados da capa do jogo – como unidades da sua party, e zanza normalmente pelos mapas atrás de itens, entulho e lembranças da civilização anterior, exatamente como um RPG de ação leve “normal”, até topar com inimigos. Aí entra a primeira grande sacada de Mutant Year Zero: você pode se esgueirar e dar a volta para encontrar um inimigo que se isolou, entrando em combate somente com ele de início. Se conseguir iniciar a luta sem ser visto e eliminar o adversário ainda no seu turno com armas silenciosas, o combate acaba na hora, e você reduziu os números inimigos naquela área.

Esse é um diferencial para XCOM que se integra bem à exploração e tensão do cenário e, em alguns mapas, permite coisas maravilhosas como eliminar todos os capangas um a um sem alertar o “chefe” da área – é só ter paciência, investigar toda a área e prestar atenção nas rondas de cada unidade inimiga. O jogo foi tão feito para isso que iniciar o combate de peito aberto, sem examinar o resto do mapa e diminuir as fileiras adversárias, pode levar a confrontos bem difíceis em que você talvez escape por um fio, se escapar. E o combate em si é um ótimo clone de XCOM com uma vantagem crucial: lembra dos momentos de azar extremo em que sua unidade errava três tiros com mais de 90% de chance na sequência? Em Mutant Year Zero, esses casos simplesmente não acontecem. De alguma forma, as probabilidades foram ajustadas a seu favor, a ponto de não ter errado um tiro de 75% que fosse até agora, mesmo depois de horas e horas jogando.

O jogo também não tem gerenciamento de base, e sim um hub estático – a Arca – com as lojas para os diversos tipos de upgrades e aquisições de armas, como em um RPG. O sistema de progressão é bem acelerado, distribuindo níveis de personagem sem parar, já que você vai precisar de bastante pontos para comprar as Mutações das suas unidades, ou as ações/habilidades únicas que elas podem usar nos turnos de combate. Por exemplo, Dux, o pato, pode voar para ganhar os benefícios de terreno elevado (detalhe: com asas de mariposa, não de pato!), enquanto Bormin, o porco, pode sair correndo e nocautear um adversário por um turno, inclusive atravessando paredes no processo. Você encontra outras unidades com o tempo, mas não muitas: por enquanto só achei mais dois mutantes mais humanos, e de qualquer forma você só leva até três unidades a campo.

Somando tudo isso, o que temos aqui é uma espécie de XCOM “light” não no combate, mas no conteúdo em geral, eliminando o excesso de gerenciamento de inventário e base para colocar no lugar um lado narrativo mais forte, um cenário mais único do que invasão extraterrestre e um tom menos opressivo, tudo funcionando a favor de quem gosta de RPGs e jogos de aventura mas não morre de amores por estratégia. É um meio termo bem inteligente que entra naquela categoria de colcha de retalhos que acaba não se parecendo demais com nenhuma das inspirações. Os valores de produção de Mutant Year Zero, incluindo o visual e as atuações dos dubladores, estão acima da média para um jogo não-AAA (é publicado pela Funcom, então não exatamente “indie”). Ah, e ele parece ter uma duração bem mais razoável do que os XCOMs, na casa das 15-20 horas, com um preço menor de acordo (R$ 88 no momento, fora os 20% de desconto para assinantes do Game Pass).

Eu andava bem sem paciência para jogos de estratégia, até mesmo para séries que adoro como Valkyria Chronicles (não comprei o quarto jogo até hoje, inclusive), mas Mutant Year Zero, com sua ênfase maior em narrativa e exploração e sua ideia sensacional de embutir stealth para enfraquecer fileiras inimigas, me fez relembrar como jogos táticos podem ser divertidos – e como podem ficar ainda mais envolventes só com algumas mudanças espertas aqui e ali. O combate tático vira um meio, assim como o combate de turnos em um RPG das antigas, e não um fim em si. Isso quer dizer que Mutant Year Zero não vai saciar os viciados em jogos de estratégia 4X de PC, que esperam dezenas ou centenas de horas de combate ultraintricado… Mas pode facilmente introduzir “não iniciados” ao gênero sem sacrificar os preceitos mais centrais de tática. Recomendo fortemente, e se continuar encontrando pérolas como essa a cada mês – Void Bastards tem cara de ser outra – os R$ 14 mensais vão virar uma barganha.

O primeiro miniconsole a gente nunca esquece: PlayStation Classic

No fim do ano passado, quando a Sony anunciou seu próprio miniconsole com o PlayStation Classic, eu me empolguei só com a presença de Revelations: Persona (o primeirão!) e deixei isso claro aqui. Mas é óbvio que parte do artigo era hipérbole: não iria pagar 90 trumps + rios de imposto só para ter essa experiência. Por outro lado, com uma redução de preço… De certa forma, foi bom o aparelho não ter sido tão bem recebido ou cobiçado quanto os miniconsoles da Nintendo, já que isso causou uma baixa mais rápida. Agora, seis meses depois, com o PlayStation Classic saindo pela metade do preço no exterior e aparecendo em lojas daqui pelo equivalente a pouco mais do que um jogo inédito de Switch… Chegou a hora, e comprei o bichinho.

Mas antes de passar para as minhas impressões sobre o aparelho, vamos tirar algumas coisas do caminho antes.

Objeções gerais de senso comum

Não tente me enganar, eu sei que você pensou em um, senão vários, argumentos imediatos para ignorar completamente o PlayStation Classic. Ei, eu ainda leio comentários e posts em fóruns de vez em quando, e sei quais são as reações gerais a ele. Então vamos começar com esses objeções todas e por que as ignorei, em grande parte, e decidi comprar o troço assim mesmo:

– Mas os jogos!…

Sim, eu sei, a lista de 20 títulos está longe de ser a ideal. Mesmo que não fosse possível trazer tudo ao mesmo tempo agora, falta coisa demais para não chamar a atenção: Tomb RaiderSilent HillChrono CrossTony Hawk, Symphony of the Night, Dino CrisisLegacy of Kain, Crash Bandicoot yadda yadda yadda. Mas eu vou arriscar uma opinião polêmica aqui: é muito, muito mais fácil para a Nintendo rechear um NES ou SNES Classic com os melhores jogos dos consoles originais quando uma boa maioria deles era da própria Nintendo e nunca ganhou remake. Repare como todos na lista acima são de terceiros, e que vários ganharam remakes ou relançamentos recentes. Por fim, essa foi a era de início do uso de música licenciada em jogos, e esse tipo de coisa pode complicar bastante a liberação atual deles; muito provavelmente, isso explica a ausência de um Gran Turismo.

Levando tudo isso em conta, a presença de clássicos como Metal Gear SolidFinal Fantasy VIIResident Evil, Ridge Racer Type 4 e Tekken 3 de publishers terceiras já é um tanto surpreendente. Junte outros jogos bons à época (ou até hoje!) que marcaram o console, sejam da própria Sony, como Twisted MetalWild ArmsSyphon Filter, ou de terceiras, como Destruction DerbyGrand Theft Auto, Oddworld: Abe’s Oddysee, Super Puzzle Fighter II Turbo e Rayman, e você tem pouco mais da metade da lista em um nível acima da média. De resto, há uma ou outra gema inovadora para a época, como o óbvio Revelations: PersonaJumping Flash! (plataforma em primeira pessoa!) e Battle Arena Toshinden (o primeiro jogo de luta com armas em 3D)… e um punhado de jogos com cara de medianos escolhidos para tentar ampliar o escopo de gêneros representados. Daí Cool Boarders 2, na falta de Tony Hawk; Mr. Driller e Intelligent Qube representando quebra-cabeças; ou o Rainbow Six original como FPS, mesmo sendo talvez a pior versão.

Não é a melhor das listas, mas também acho bem mais razoável do que fazem tentar parecer. O que mais me espanta não é a falta de tantos jogos ultrafamosos, e sim algumas das escolhas “menores”. Por exemplo, cabia mais um ou dois JRPGs na lista, como Suikoden, Breath of Fire, Xenogears ou Vagrant Story, esquecidos pelas suas publishers detentoras. Também faltou um jogo de plataforma 3D – não era esse o diferencial do console? – como Gex ou Ape Escape (esse também da própria Sony!). Se era para escolher um FPS, os ports de Doom ou Quake 2 ou o on rails Time Crisis fazem mais sentido que Rainbow Six. A estratégia ficou de fora, mesmo com exemplos como Final Fantasy TacticsX-Com: Terror From The Deep. Há também a ação de MDK, a aventura de Fear Effect… E por aí vai. No fim das contas, a lista ainda é boa… Só não é US$ 90 boa. A um preço camarada, porém…

– Por que não comprar um Raspberry Pi logo?

Outra questão que sempre aparece nessas horas é… Se você vai comprar algo para jogar coisas retrô na sua TV, por que não pagar um valor parecido por um produto como o Raspberry Pi, que permite inserir ROMs à vontade de diversas plataformas ao mesmo tempo? Bom, no meu caso, o motivo é falta de paciência para mexer com essas coisas abertas. Eu já brinquei com emuladores no PC – inclusive recentemente, para saber como era o primeiro Monster Hunter no PS2 – e por mais simples que softwares de emulação sejam hoje em comparação com anos atrás, ainda há um tanto de “trabalho” envolvido. Configurar, caçar ROMs, baixar, ajustar janela etc. etc. etc. Com produtos como os miniconsoles da Nintendo e da Sony, tudo é plug-and-play, sem estresse e com garantia: ligou, funcionou. Sem risco de vírus, sem peso na consciência.

Em outras palavras, é quase o mesmo que escolher um console em vez de um PC… e o PlayStation Classic veio em um momento da vida em que estou com cada vez menos saco de lidar com as chateações ocasionais de jogar no PC. Por exemplo, as atualizações recentes de Monster Hunter: World de alguma forma pioraram o desempenho do jogo no meu PC, e se é para ter que botar tudo no low e ainda ter um pouco de stuttering, prefiro jogar no PS4 Pro a 30 frames estáveis. Além disso, um dos atrativos dos miniconsoles é reproduzir a experiência original o mais fielmente possível, eliminando apenas – e justamente – as chateações de setup que você teria se arranjasse um original usado hoje, como lidar com cabos componentes e assim por diante. Por fim, o conceito de miniconsole é mais interessante porque eu não tive os originais na época, então a experiência é mesmo nova para mim.

– Os controles não são Dualshocks!

Outra coisa que alguns reclamaram é que o PlayStation Classic vem com dois controles originais, sem alavancas analógicas, e não os Dualshocks posteriores. É compreensível se preocupar com isso quando estamos falando justamente do console que popularizou os jogos em 3D, mas depois de uma olhada com calma na lista final dos jogos, cheguei à conclusão de que não faria tanta diferença quanto se imagina. Como já notei aqui, não há jogo de plataforma 3D, e o único FPS incluso eu não devo jogar nessa versão de qualquer forma. A imensa maioria dos jogos que realmente vou jogar bastante são RPGs, plataforma 2D, corrida e luta, e funcionam tão bem com um d-pad quanto com uma alavanca. Uma boa parte do resto da lista, como os de puzzle, cai no mesmo caso. Mesmo Metal Gear SolidResident Evil eram jogos tão “duros” de movimentação que usar o d-pad não faz tanta diferença assim.

Uma exceção que já notei foi Syphon Filter, que realmente parece ter sido feito para aproveitar o Dualshock, mas mesmo nesse eu estou conseguindo me virar. Também imagino que a plataforma em 1ª pessoa de Jumping Flash! possa ser um problema, dependendo da precisão que o jogo exigir nos pulos. E embora isso possa ser chato, ao jogar Syphon Filter, notei outra coisa também: faz parte da tal questão de “viver a experiência do original”. Eu não fazia ideia de como era controlar um personagem livre em um jogo de ação 3D só com o d-pad, e agora sei. Se isso atrapalhasse a maioria dos jogos, poderia ser frustrante demais. Mas afetando apenas um ou dois no total de 20… A sensação é de que o jogo tem que ser muito bom para compensar, e é uma sensação interessante, que recai exatamente no que eu buscava: viver como foi jogar um PlayStation original na época.

O aparelho em si

Passando ao que realmente interessa, as minhas primeiras impressões do aparelho em si são bastante favoráveis. Ele parece mesmo com o console original, noves-fora o tamanho reduzido (pouco maior do que um 3DS XL) e as mudanças nas entradas para padrão HDMI e USB. O PlayStation Classic é bem leve e ainda assim aparenta ter uma boa resistência. Os controles são um pouco menores do que os originais, mas ainda de bom tamanho mesmo para mãos grandes como as minhas. Os cabos deles são um pouco curtos, de mais ou menos 1,5 m, talvez justamente para passar aquela sensação de sentar no chão na frente da TV para jogar com os amigos. Por fim, o console não vem com um carregador, e sim um cabo USB que pode ser ligado em um adaptador de CA de celular comum (usei um antigo da Samsung sem problema). Ah, e os memory cards são virtuais, obviamente.

Os botões do aparelho têm funções simples e interessantes em comparação ao console original. Power obviamente liga e desliga o aparelho, enquanto Reset sai do jogo executado e volta para o menu principal do Classic. E aí vem a surpresa… E o botão Open? O Classic abre? Não, é claro, mas serve para trocar de disco virtual em jogos que originalmente vinham em mais de um, como Final Fantasy VIIMetal Gear Solid. Legal, né? Ah, e eles parecem tão duráveis quanto o resto do aparelho, sem sinais de que possam “engripar” ou quebrar de alguma forma.

Quando você junta tudo isso, fica claro que, além de tentar reproduzir a experiência original, esses miniconsoles foram imaginados para facilidade de transporte. A ideia é que seja bem, bem fácil colocar tudo – console, controles, cabos – no bolso de uma mochila e levar para a casa dos outros para todos reviverem a nostalgia da coisa. Até a falta de carregador parece mais lógica assim, já que hoje em dia praticamente todo mundo tem um carregador de celular em casa, e transportar uma fonte moderna ocuparia bem mais espaço e peso. A facilidade da montagem – pluga na TV e na tomada, pluga os controles, liga e pronto – e o caráter offline, com tudo na memória e nada de atualizações ou configurações de sistema e afins, só corrobora ainda mais as duas sensações: a de voltar no tempo e a de poder levar para qualquer lugar sem dor de cabeça.

Sistema e interface

O menu principal é bem simples e elegante, como seria de se esperar de um produto da Sony, com alguns toques de design que remetem a tempos passados. Ele carrega rápido, logo após a imagem e o som do logo da Sony Entertainment da época. As capas dos jogos aparecem no topo em uma disposição oval rotacionável, em que você vai trocando até o título que você quer jogar ficar à frente, e exibem informações básicas como desenvolvedora, ano de lançamento e se é para 1 ou 2 jogadores. A base da tela inclui quatro opções – Settings, Guides, Memory Card e Resume Point – em ícones com cara da época, com direito a cantos pixelados e tudo mais. O mesmo vale para os prompts de botão logo abaixo, como X – Enter, O – Back, etc. Até o fundo é um degradê azul levemente pixelado. Se os textos de informações/tooltips não fossem tão nítidos e modernos, você nem desconfiaria que esse menu foi criado depois de 2000.

Já as funções disponíveis variam do surpreendente ao econômico demais. Por exemplo, as opções de idioma são amplas, incluindo Português do Brasil (mas lembre-se que os jogos em si não terão pt-br, e alguns nem legendas exibem nas cutscenes). Já Guides inclui apenas uma imagem explicando os botões do console e um QR Code/link quebrado (sério!) para o site do produto. O real é esse aqui, expondo algo gritante: por que não incluir esses manuais dos jogos direto no aparelho? São PDFs curtos, com certeza caberiam. Memory Card permite excluir saves do jogo realçado acima, uma solução interessante. Por fim, Resume Point é um save state gravado quando você sai de um jogo, com direito a prompt de confirmação, caso queira manter o anterior. Pelo que li, os miniconsoles da Nintendo permitem até 4 save states, mas com a ampla quantidade de slots nos memory cards virtuais, não senti necessidade de mais do que um aqui.

Uma coisa que preciso deixar claro é que não há upscaling; isto é, os jogos são exibidos exatamente como eram, em proporção 4:3 (não widescreen) no centro da tela, deixando as laterais pretas. O sistema em si não permite “forçar” um “esticamento” da janela para ocupar a tela inteira, embora a maioria dos jogos permita ajustar a posição da janela (pelo que me lembro, jogos às vezes não ficavam bem centralizados em TVs de tubo, daí o recurso ser comum). Não é um problema real considerando que o caráter “blocão pixelado” dos jogos da época não iria escalar bem de qualquer forma, e a ideia é reviver os jogos como eram mesmo. Mas se você tem uma TV 4K grande demais, tipo de 50 polegadas ou acima, esteja ciente de que esses blocões pixelados vão “estourar” ainda mais. Na minha TV Full HD de 42 polegadas, os jogos simplesmente ficam com a cara de jogos de PS1 como os imaginava.

Desempenho e conclusões gerais

A emulação dos jogos, até onde eu vi, é absolutamente perfeita, sem nenhuma espécie de engasgo, artefatos visuais estranhos aos jogos originais ou qualquer outro tipo de erro. Tudo que joguei carregou e rodou exatamente como parecia ser originalmente, com loadings equivalentes e nunca longos demais. Para os usuários de olho mais técnico, parece que alguns jogos (Grand Theft Auto, por exemplo) vêm nas versões europeias, com taxa de atualização PAL (50 Hz) em vez de NTSC, mas se isso faz alguma diferença visual ou de latência nos controles, eu realmente não notei. Eu vi que Ridge Racer Type 4 usa os botões X e O no esquema invertido japonês (X cancela, O confirma), e ainda não abri todos os jogos para saber se é um caso isolado, mas isso não vai realmente atrapalhar ninguém de jogar.

No geral, o PlayStation Classic é exatamente o que eu queria e esperava pelo preço que paguei, pouco menos de R$ 300. É uma máquina que parece reproduzir fielmente a experiência original sem incluir as chateações de plugar um PlayStation original usado, e com um bom punhado de jogos que ainda precisava experimentar ou terminar em qualquer formato, quanto mais com controles e apresentação “clássicos”. Só os RPGs – Final Fantasy VII, Wild Arms, Revelations: Persona – já vão me ocupar por uma ou duas centenas de horas e justificar o custo. Não devo jogar a lista inteira até o final, claro, mas pelo menos metade eu devo terminar com calma, sempre que bater aquela vontade de imaginar como seria ter jogado essas coisas lá nos meus 20 anos de idade. Talvez eu escreva mais sobre os jogos depois, mas por enquanto, esse artigo cobre mais o valor do produto em si mesmo.

Se isso vai se aplicar a você, considere todas as objeções lá de cima e os pontos fortes do resto do artigo. Ainda tem saco de configurar emulador e baixar ROMs? Compre um controle retrô pro seu PC ou um Raspberry Pi. Não consegue mesmo jogar sem alavanca analógica? Sua única opção com um PlayStation Classic seria comprar um adaptador de terceiros para usar um controle sem fio moderno, o que sacrifica um pouco todo o lance de (re)viver a experiência original. Tem um PS3 ou PS4 e poderia comprar alguns dos jogos inclusos na PSN? OK, mas lembre-se que, dependendo do que for comprar, o valor total pode acabar saindo o mesmo, e alguns nem disponíveis estão (Revelations: Persona original só no PS3, por exemplo). E se o interesse real for a tal experiência autêntica… Aí não vejo motivo para desdenhar do Classic. O miniconsole em si entrega essa experiência, sem dúvida alguma; vá sem medo.

PAREM AS MÁQUINAS: PERSONA NO PLAYSTATION CLASSIC

Pela primeira vez eu vou comprar um desses consoles “mini clássicos” sem pestanejar: o PlayStation Classic terá Revelations: Persona, o primeiro jogo da série!

Não quero nem saber se a lista não inclui coisas como Silent Hill e Castlevania: Symphony of the Night (tsc tsc, Konami) ou CrashTomb Raider, ou mesmo que inclua Final Fantasy VII, Metal Gear Solid, Resident Evil, Tekken 3, Grand Theft Auto etc. Boa parte disso está disponível nas plataformas atuais, às vezes em remasters/remakes ou que rodam melhor que as originais. Ainda por cima, o controle incluso é o original também, sem analógico, o que vai ser bem chatinho nos jogos em 3D mais puxados para a ação.

Mas Revelations: Persona é um RPG de turno e se quiser jogá-lo hoje, tenho que ligar e tirar a poeira do meu PSP ou PS3. Se é para pegar um desses consoles minis pela “experiência autêntica”, que seja em nome de jogos como esse, que não terminei e/ou não estão tão imediatamente disponíveis (tirando emuladores, claro). E que seja para a Atlus ganhar mais um troquinho também. Ah, e pelo que ando vendo, o jogo original sai por uma fortuna no eBay. Se você não quer suportar pirataria e é fã de Persona, essa é uma maneira legítima de ter a experiência original de Revelations.